segunda-feira, 7 de abril de 2008

AUTOCONHECIMENTO - Inteligência Emocional

Admirável Mundo Deprimido

Nunca se ouviu falar tanto em depressão como na atualidade. Poderíamos até dizer que o mal do século é a depressão - novo nome dado ao sofrimento psíquico. Nunca se teve tanta liberdade, tantos avanços na área científica e tecnológica. No entanto, nunca se ouviu falar tanto de pessoas deprimidas.

No mundo globalizado não há espaço para as queixas, há que se seguir sempre em frente, sem tropeços. Não se deve pensar na morte, na velhice, nos infortúnios da vida. A ordem da contemporaneidade é fazer tudo, ao mesmo tempo, agora. Mas, as coisas nem sempre são como se quer. No meio do caminho, como poetizou Drummond, há sempre uma pedra. E é essa pedra que faz obstáculo ao bom andamento das coisas.

Assistimos hoje, como nunca, a uma busca desenfreada por soluções mágicas, rápidas e indolores. Dos psicofármacos aos curandeiros, bruxos e videntes, vemos emergir toda uma sorte de práticas, trazendo novos deuses e novas religiões. A cura está em toda parte: no Prozac, no destino, na fé, na sorte.

As livrarias estão cheias de manuais para se obter a felicidade. São manuais que dizem como educar os filhos, como trapacear na empresa, como lucrar sempre mais, como viver um grande amor, como lidar com pessoas difíceis. O mais estarrecedor é que esses livros não saem das listas dos mais vendidos. Há quem leve isso a sério, esperando que, um dia, “o universo conspire a seu favor”.

A farmacologia é a campeã em efeitos urgentes. Promete curar o homem até de sua própria humanidade. Para todos, em todas as situações, receita-se o mesmo. Nem sequer a dor da perda de um ente querido as pessoas querer mais sentir. Toma-se o remédio e não se fala mais disso. Vemos pessoas dopadas, passando pela vida como que anestesiadas, robóticas, pálidas, alheias a tudo.

O bom médico é aquele que pode ofertar para cada queixa um remédio. Foi-se o tempo em que o médico ouvia o paciente, como fazia o antigo “médico de família”, que sabia todos os segredos de alcova. Os médicos, em seus consultórios lotados, não têm mais tempo para se ocupar do singular de cada sujeito.

Esse é o admirável mundo depressivo, onde não há espaço para o sofrer, onde só se deve gozar, desenfreadamente,
irresponsavelmente, a todo custo. Há, em Aldous Huxley, em seu Admirável mundo novo, uma passagem com a qual concluo: “ Reivindico o direito de ser infeliz. Sem falar no direito de se tornar velho, feio e impotente; de ter sífilis e câncer; de não ter o que comer; o direito de ter piolhos e de viver em constante apreensão sobre o dia de amanhã; o direito de contrair tifo, de ser torturado por dores indizíveis de toda a espécie”.



Myrna Maracajá - Psicóloga, especialista em clínica psicanalítica.
Jornal da Paraíba, 14/ 09/ 06

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